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Relato # 1 / Inaugurando o blog!

julho 1, 2008

Olá! Antes de tudo, acho que existem algumas poucas coisas que precisam ser ditas a meu respeito: sou conhecida como Jobis, tenho 25 anos, sou casada com um deficiente visual. Na verdade, nós dois somos deficientes visuais.

Outro fato importante a meu respeito é que quando engravidei, não sabia de nada dessas coisas. Simplesmente não fazia a menor idéia e de certa forma, não me importava muito. Não que eu fosse algum tipo de relapsa, por favor. Só que eu era como quase todo mundo: só se importa a sério quando as coisas começam a acontecer.

Bem, pra falar a verdade, eu pensei que não ia amamentar. Não que eu não quisesse, claro, mas diziam que eu não conseguiria e eu achava que ia ser assim mesmo. A propósito, costumavam dizer bastantes coisas negativas sobre um bebê em nossa casa. Acho que isso é mais por estarmos no interior que por uma inépcia comprovada de casais cegos em cuidar de bebês.

Mas uma coisa deve ser dita sobre essa fase: eu queria um parto normal. Queria muito. Não que eu tivesse as informações que tenho hoje. O parto normal parecia simplesmente, mais prático. Para ser bastante honesta, eu tinha medo de fazer cesárea e isso servir de desculpa para as pessoas não me deixarem cuidar de meu bebê e depois que eu estivesse de certa forma ok, eu ter entronizado todas aquelas coisas horríveis que diziam sobre afogar bebês na banheira e etc. e tal.

Quando nosso bebê nasceu precisou ir para a UTI. Assim que tive alta do hospital, meu esposo e eu partimos para ficar na mesma cidade dele. As visitas eram de uma hora e foi na primeira delas que eu fiquei perto dele de verdade.

Lembro de pensar sempre que não tinha o menor controle sobre o que iria acontecer a partir dali. Tecnicamente, ele podia nem voltar para casa, e eu só desejava que ele soubesse que era muito amado e infinitamente querido e bem-vindo independendo de tudo que disseram ou viessem a dizer sobre nossa família.

No hospital assisti a uma palestra sobre amamentação que virou minha cabeça. Claro que eu tinha pesquisado e lido textos do tipo “porque a amamentação é tão boa para seu bebê”, mas nenhum teve a força daquelas palavras. Lembro de ter me impressionado com os benefícios a longo prazo sobre a inteligência, o emocional e a imunidade dos bebês. Aquilo fez toda a diferença. Eu queria, e muito, e faria qualquer coisa para que ele amamentasse exclusivamente até os seis meses.

Então passei do grupo de “mães basicamente informadas e sem tanta garra” para o grupo de “mães que querem o melhor e vão atrás disso”.

No próprio hospital tive contato com a ordenha e comecei a enviar leite para meu filho. Era emocionante pensar que seria uma forma de estar perto sem estar. As enfermeiras tinham todo o jeito de que diriam de onde vinha o leite que ele estava tomando. Lembro de bendizer cada incômodo, cada dor que vinha durante a ordenha, e de até me sentir grata por proporcionar isso ao meu filho.

Um dia, disseram que a fonoaudióloga ia avaliar o meu filho e durante a tarde, se tudo tivesse corrido bem, faríamos uma tentativa de amamentação. Contudo, já na visita do meio-dia, informaram-me que estava tudo mais que perfeito e que ele estava pronto para mamar naquele mesmo momento.

Claro que não dá para esquecer da primeira vez, os fios, o lençol fino, a boquinha procurando e encontrando, a sucção, o prazer inerente, as mãos dele encostadas ao meu seio como estrelas do mar excepcionalmente quentinhas e vivas. Depois fomos para casa. Antes, falaram-me de forma realmente amorosa sobre “ele não ser mais um bebê de UTI” e a amamentação ter de mudar. Foi aí que as coisas começaram a complicar.

Chegando em casa, o pediatra que o recebeu foi aquele que consultamos, inicialmente. Ele disse que o Estêvão tinha que mamar dez minutos em cada seio, para pegar todos os leites. Na época, eu ainda era tímida demais e fazia sem pestanejar o que indicavam. Foi um desastre. Cheguei até a usar um relógio para isso, o que se mostrou francamente traumático.

Bem, nós batalhamos um bocado para encontrar “nosso jeito”. Por exemplo, eu nunca me dei bem com a posição tradicional. Sei lá, parecia que minhas mãos estavam perdendo alguma coisa e careciam de mobilidade.

Eu me sentava sem blusa no meio da cama ou de qualquer lugar assim, com as pernas cruzadas e meio embaixo do corpo, o Estêvão se apoiava nelas e mamava, reclinado e apoiando a cabeça na palma da minha mão (meio estranho descrever, sinto muito).

O fato é que ele acabou mamando na mamadeira no primeiro mês, mas do segundo em diante, eu simplesmente me negava a considerar isso. Na verdade, a partir do segundo mês nós nos estruturamos de tal forma, que ele não acordava de madrugada para mamar e estávamos super bem.

Lembro de uma noite em que ele estava na UTI, eu esvaziei uma das mamas na mão, para ver se eu sentia quando o leite se alterava. Bem, eu consegui, e isso ajudou muito, porque eu sempre era capaz de dizer se ele tinha ou não mamado os três tipos.

O importante é que por três meses tudo foi muito bom, até que no começo dos cinco meses, ele simplesmente “desistiu”. Eu tinha até tirado a chupeta, dentre outras coisas, para evitar um desmame e sem aviso, Estêvão simplesmente não tinha o menor interesse em mamar em mim. Foi frustrante, muito ruim.

Passei duas semanas tentando todos os dias e nada. Quando no segundo dia capitulei e concordei com a mamadeira, meu esposo teve de oferecê-la, porque eu simplesmente não era capaz de fazê-lo com meus seios transbordando leite que ele “não queria beber”.

Uma consultora até veio aqui em casa, explicar que, se ele tinha desmamado, era que já era o momento, que, não, eu não tinha feito nada errado, que eu estava de parabéns… Mas eu não conseguia absorver a informação. Lembro que não conseguia parar de chorar enquanto ela tentava dizer que estava tudo bem.
Como não tinha outro jeito, ele começou a tomar leite e a ser alimentado e seu desenvolvimento seguiu normalmente. O ponto era que meus seios jamais secavam. Diziam que eu tinha que não mexer neles, mas era realmente impossível quando eles enchiam e ameaçavam empedrar ou começavam a vazar. Chegaram a me receitar remédios para secar mas francamente, eu não me sentia pronta para fazê-lo. Eu sei que soa dramático mas pensava realmente que o leite não me pertencia, era do Estêvão, e que eu não tinha o direito de dispôr dele mesmo que ele não quisesse. Sei que não parece muito lógico, mas nem sempre nós somos
realmente lógicos.

Nem sei em que parte da conversa eu relatei isso na Best Baby* mas sei que o Estêvão tinha quase nove meses. Sugeriram relactação e infelizmente não lembro precisamente quem sugeriu que eu simplesmente lhe oferecesse o seio outra vez.

Eu achei muito improvável ele aceitar, porque tinha feito isso debalde até os seis meses e meio mas pensei que não tinha nada a perder… e ele pegou, voltou a sugar do mesmo jeito, todo contente da vida.

Hoje Estêvão tem um ano e ainda mama. Digamos que o LM é sua sobremesa. Muitas pessoas não entendem, é claro mas se tudo pelo que passei durante a gravidez me ensinou alguma coisa foi que muita gente não se importa com o que nos diz, sequer se é verdadeiro ou necessário, tampouco positivo.
Não me preocupo com o desmame. Acho que ele vai largar quando estiver pronto, ou, sei lá, meu leite vai secar. Não me importo. Quero que ele mame tanto quanto quiser. É um prazer oferecer o leite e ele gosta de tê-lo. É uma forma de estar perto diferente de todos os “outros tipos de proximidade”.

Estamos planejando outro bebê, e é factível que emendemos uma amamentação na outra. Não sei.
Penso que o aleitamento é muito mais que uma opção, embora muita gente diga que a improtância da amamentação é moda e que o leite artificial é tão bom quanto. Penso que envolve fatores muito mais graves que a nutrição do bebê; envolve laço, segurança materna, cumplicidade e acho, a ativação de muitas coisas viscerais que vão nos equipar melhor para o que virá.

Acho que está sendo muito importante para nós dois a amamentação prolongada, como se ela nos aproximasse de uma maneira diferente. Parece que nosso nível de troca interpessoal transubstanciou-se na medida em que seu desenvolvimento progredia. Acho que não consigo expressar isso em palavras. Estou tentando dizer que as impressões emocionais são diferentes, que o que capto dele mudou, que é como se tivéssemos um laço invisível que fluísse dele para mim e de mim para ele, como se isso me permitisse perceber coisas emocionais dele que de outra forma talvez eu não percebesse.

Talvez outras mães não sintam isso, não sei se já foi relatado alguma vez. De minha parte, imagino que o efeito é equivalente ao que eu teria se pudesse olhá-lo nos olhos, embora não consiga encontrar o porquê o equivalente emocional passaria com o ato da amamentação.

Mas outra coisa que aprendi com a maternidade é que muitas das “revelações” que se tem não possuem um perfeito encadeamento lógico, não sendo, porém, só por isso menos válidas ou preciosas em si mesmas.

Jobis, 25 anos, mãe do Estevão.